Notícia 04.04.2020

Obras, mudanças e visitantes de unidades condominiais neste momento de enfrentamento ao Covid-19

Direito Condominial

Inúmeros são os gestores de condomínios que, diante de decretos e medidas necessárias para conter a disseminação do Covid-19, relatam dúvidas sobre a circulação em unidades condominiais, procedimentos de distanciamento social, controle de acessos, execução de obras, visitas e até mudanças.


Por conta disso, preparamos alguns esclarecimentos e orientações.


I - Obras em unidades condominiais (apartamentos, casas, salas, conjuntos e outros)

 

Entre decretos municipais e estaduais permanece a dúvida quanto a possibilidade de realização de obras, em momento de isolamento social, em unidades em condomínio. 

 

A ausência de abordagem clara ou previsões que parecem conflitantes nos decretos de âmbito estadual e municipais têm ocasionado diversos conflitos entre síndicos, preocupados com a adoção de medidas voltadas ao enfrentamento da pandemia, e proprietários de apartamentos que tentam avançar com obras que já estavam em andamento, ou, muitas vezes, iniciar obra de reforma em sua unidade.

 

De imediato cabe destacar que o DECRETO Nº 55.154 DE 1º DE ABRIL DE 2020 do governo do Estado do Rio Grande do Sul reitera a declaração de estado de calamidade pública e impõe medidas para prevenção e enfrentamento à epidemia. O referido decreto se sobrepõe a decretos municipais em disposições conflitantes, conforme expressa previsão no Art. 44 do Decreto assinado pelo governador:

 

Art. 44. Fica suspensa a eficácia das determinações municipais que conflitem com as normas estabelecidas neste Decreto, respeitada a atribuição municipal para dispor sobre medidas sanitárias de interesse exclusivamente local e de caráter supletivo ao presente Decreto.

 

O decreto mencionado apresenta, já em seu Art. 2º, as medidas sanitárias de adoção obrigatórias, dentre as quais destacamos o inciso I:

 

Art. 2º As autoridades públicas, os servidores e os cidadãos deverão adotar todas as medidas e providências necessárias para fins de prevenção e de enfrentamento à epidemia causada pelo COVID-19 (novo Coronavírus), observado o disposto neste Decreto.

Parágrafo único. São medidas sanitárias, de adoção obrigatória por todos, para fins de prevenção e de enfrentamento à epidemia causada pelo COVID-19 (novo Coronavírus), dentre outras:

I – a observância do distanciamento social, restringindo a circulação, as visitas e as reuniões presenciais de qualquer tipo ao estritamente necessário;

 

O inciso I determina expressamente a adoção de medidas de restrição de circulação, visitas e reuniões presenciais de qualquer tipo, cabendo ao síndico do condomínio, representante e responsável pela defesa dos interesses da coletividade, a aplicação de tais medidas restritivas no âmbito de seu condomínio.

 

A continuidade ou início de obras em unidades, ao nosso ver, constitui desrespeito às restrições de circulação de pessoas, uma vez que trabalhadores, ou seja, não residentes no condomínio, estarão diariamente entrando e saindo, assim como procedendo com recebimento e trânsito de materiais por áreas de circulação.

 

Da mesma forma, o determinado distanciamento social não é observado quando consideramos que um grupo de funcionários irá permanecer reunido, por horas diárias, dentro da unidade na execução da obra.

 

Importante ressaltarmos que podem ocorrer casos excepcionais, como obras necessárias, emergenciais ou mesmo imprescindíveis para a habitação da unidade. E, nestas hipóteses, é recomendada a flexibilização para que aquela unidade possa ter condições de executar as obras que viabilizem a habitação da residência e, consequentemente, condições de acolhimento da família que, como as demais, deverão exercer e respeitar as medidas de distanciamento social.

 

Por fim, importantes destacarmos que, em nosso entendimento, a hipótese prevista no inciso V do parágrafo 2º do Art. 5º, que apresenta exceções à restrição de abertura e funcionamento, e tem sido utilizada como argumento por proprietários que pretendem prosseguir com obras em suas unidades, não se aplicaria à obras em unidades em condomínio, visto que a possibilidade prevista viabiliza a abertura do estabelecimento de construção civil, não sendo razoável que esta liberação para funcionamento seja interpretada de forma extensiva a unidades em condomínio, onde, conforme exposto, deve prevalecer as normas de proteção coletiva.

 

Art. 5º Fica proibida, diante das evidências científicas e análises sobre as informações estratégicas em saúde, observado o indispensável à promoção e à preservação da saúde pública, para fins de prevenção e de enfrentamento à epidemia causada pelo COVID-19 (novo Coronavírus),com fundamento no art. 3º da Lei Federal nº 13.979, de 6 de fevereiro de 2020,a abertura para atendimento ao público,em caráter excepcional e temporário,dos estabelecimentos comerciais situados no território do Estado do Rio Grande do Sul.

 

§ 2º Não se aplica o disposto no “caput” às seguintes hipóteses:

III – aos estabelecimentos industriais de qualquer tipo, inclusive da construção civil, vedado, em qualquer caso, o atendimento ao público que importe aglomeração ou grande fluxo de clientes.



II - Realização de mudanças

 

Cumpre destacar que inexiste referência nos decretos quanto a realização de mudanças, situação que deixa a cargo de cada condomínio, conforme suas particularidades, a definição de procedimentos que preservem o distanciamento social recomendado e os cuidados redobrados com a higienização. 

 

Entendemos que, por se tratar muitas vezes de situações não contornáveis pelo morador ou proprietário, como contratos de locação encerrados ou prazos para entrega do imóvel, a realização de cancelamento ou transferência da mudança se torna inviável.

 

O que concluímos é que simplesmente proibir não seria possível, porém caberia ao síndico impor limitações, como, por exemplo, isolamento do local a ser utilizado para trânsito dos móveis, limitação ao número de pessoas que trabalharão na mudança, exigência de procedimentos de higienização complementares que deverão ser adotados pelo condômino, redução de horário para realizar mudança de modo a se evitar momentos de maior circulação de moradores, entre outras medidas.

 

III - Recebimento de visitantes

 

A utilização da unidade privativa é direito constitucional do proprietário ou ocupante, não podendo o condomínio impor restrições ao recebimento de visitantes. O distanciamento social é amplamente recomendado por todos os órgãos de saúde, porém cabe a cada família a conscientização da necessidade, inclusive porque é dever de cada condômino, entre outras coisas, não utilizar sua unidade de modo a prejudicar a saúde dos demais, nos termos do Art. 1.336 do Código Civil.

 

Ao síndico, além das restrições quanto a circulação e permanência em áreas comuns, bem como limitação ao acesso de prestadores de serviços e entregadores, cabe reiterar com seus condôminos a importância da diminuição ou eliminação do recebimento de pessoas que não residam no condomínio.



IV - Multas convencionais

 

Cabe ao síndico, sem dúvidas, impor medidas e, até mesmo, realizar denúncia aos órgãos competentes quando da identificação de situações de reuniões e confraternizações em unidades privativas com número de pessoas suficiente a caracterizar a aglomeração proibida pelo Decreto Estadual, situação que pode configurar, inclusive, prática de crime.


Ainda, além das medidas dos órgãos competentes, cabe ao síndico a aplicação de penalidades convencionais, inclusive multas, em face daqueles condôminos que não respeitarem as medidas impostas neste momento de enfrentamento de uma pandemia.

 

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